
Ontem vi um vídeo de Sadhguru que me acendeu uma centelha. Uma centelha daquelas que queimam silenciosamente por dentro, mas deixam lume aceso por muito tempo.
Nele, Sadhguru conta brevemente como educou a filha. Diz que, desde os três meses de idade, ela viajou com ele pelo país. Aos 18 meses, já falava fluentemente três línguas. Aos quatro anos e meio, memorizava o nome de mais de 800 pessoas. Achava que todos eram seus amigos. Ligava-lhes, conversava, ria. Porque ninguém lhe disse que ela era uma criança e os outros, adultos. Para ela, eram todos iguais.
Sadhguru nunca permitiu que lhe ensinassem o ABC, o 123, “a Maria tinha um carneiro” ou outros rituais que repetimos sem consciência. Colocou-a numa escola onde havia pouca “escolaridade”. Nada de adestramento. Nada de moldes. Apenas vida, vivida e observada.
Aos doze ou treze anos, algo perturbador aconteceu com ela na escola. Chegou a casa e disse ao pai:
“Tu andas a ensinar tantas pessoas tantas coisas, e a mim não me ensinas nada.”
Sadhguru respondeu:
“Eu não sou conhecido por fazer coisas sem ser solicitado. Agora que tu vens, vamos ver. Senta-te aqui. Isto é muito simples: Não olhes para cima para ninguém. Especialmente para mim. Se o fizeres, perdes completamente o ponto todo. Talvez consigas fazer uma fotografia de mim e prendê-la na parede. Tens de me ver como eu sou. Se me vires como eu sou, tem muito para ti. Se olhares para cima para mim, perdes o ponto inteiramente. E não olhes para baixo para ninguém. Então verás a vida como ela é. Se vires a vida como ela é, tu farás a tua vida sem esforço.”
E se nunca disséssemos a uma criança que ela é “só uma criança”? E se, em vez de ensinar a subir degraus, a deixássemos caminhar em chão aberto? E se, no lugar de educar… a víssemos?
Talvez deixasse de engatinhar em direção à gaiola.
Esta imagem não é apenas simbólica. Vê a floresta vibrante, cheia de pássaros coloridos, árvores vivas, o mundo em festa. E no meio, uma clareira. Nela, uma gaiola com telhado. Dentro, o pai e a mãe. Sentados. Submissos. Condicionados. E o bebé… vai a gatinhar para a gaiola, como quem procura instintivamente os que ama, mesmo que estejam aprisionados.
Crescemos assim. Amamos os nossos pais e, por isso, imitamo-los. Mesmo na sua própria prisão.
Mas agora que vês isto, o que farás?
Se já educaste os teus filhos com o melhor que sabias, e percebes agora o quanto de adestramento havia nisso, não te culpes. Agradece o despertar.
Talvez, como eu, tenhas uma neta a caminho da gaiola. Talvez ainda possas tornar-te a única presença livre que ela conhece.
E quando o mundo a tentar moldar, que ela se lembre:
“Havia uma pessoa que me via. Sem me corrigir. Sem me aparar. Vía-me inteira, mesmo quando eu não sabia que era pequena.”
Essa memória… pode bastar para que ela escolha a floresta.